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Incrédulo, mas sem discussões, foi com grande tristeza que meu pai aceitou o meu nome. Sempre condescendente, sempre altruísta, passivo em demasia, varreu a imagem da Azeda Musgada, engoliu o desgosto e sorriu.
- Pois que seja Maria Clementina! A nossa menina! É como uma doce tangerina.
- O que é alma? Eu tenho alma? – Perguntei verdadeiramente interessada.
- Todos temos alma, filha. A alma vive dentro do peito e aparece sempre que fazemos coisas boas, bonitas, certas. Quando não fazes maldades a alma espreita no teu peito, junto ao teu coração e é muito brilhante. Quando estamos tristes ou não queremos ou não conseguimos fazer muito bem qualquer trabalho, a alma está lá, mas encolhida e triste também. Quase perde a cor, fica embaciada como os vidros quando está frio.
Quando a luz fraca começou a entrar por uma fresta da janela que dava para o corredor, percebi que era a aurora. Já faltava pouco para a hora da escola. Nessa manhã, o dia surgiu cinzento. A luz coada que tantas vezes iluminava o Porto agradava-me e sabia bem porquê. Gostava da cacimba e das estranhas sombras que criava na minha imaginação. As ruas, as casas, as árvores ficavam com um ar de magia como nos contos. A brisa fresca também me era agradável. Até os odores da cidade chegavam mais fortes. Se os dias de sol eram lindos com a luz pura e brilhante e tudo mostravam com mais pormenor, estes mais húmidos e enevoados traziam uma indefinição criativa e não era possível ver com nitidez os detalhes das pessoas nem da paisagem, embora os elementos pudessem ser identificados e se percebesse o efeito de luz e de sombra. A combinação de cores apenas me trazia uma impressão que eu olhava, que me preenchia e acendia em mim vontade de desenhar o momento que não se repetiria. Era uma visão do que me rodeava mais breve, menos duradora, efémera.